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“A aprendizagem da aranha não é para a mosca”
Henri Michaux
Um dos grandes desafios ao se buscar unir as duas pontas do processo, gerando o circuito ensinar e aprender, além das diferenças individuais, de maturidade e expectativa, níveis diversificados na formação geral e motivação bastante particulares, está o próprio processo de recuperação da aprendizagem. Indiscutível que hoje nossos alunos possuem um perfil muito diferente daqueles com os quais nos deparamos no passado, portanto inútil se faz o saudosismo. Mas no meu tempo! Pensar na formação do aluno nos dias atuais, seja na educação acadêmica ou profissional, faz-se pensar de forma implícita a recuperação. Exclamações exasperadas como “nossos alunos sabem cada vez menos”, “chegam cada vez menos preparados”, ou ainda expressões mais contundentes como “não sabem nada” muitas vezes recheiam o intervalo da sala dos professores, nas reuniões de Conselho de Classe e outros momentos em que mais de um docente se encontram reunidos em conversa informal. O desabafo desponta.
Inegável que diante do avanço tecnológico e a expansão da educação, através de diferentes mecanismos para democratização do ensino, algumas pessoas antes excluídas do processo, passaram a ocupar os bancos escolares. A necessidade e a exigência cada vez maior de escolaridade também forçou muitas pessoas a retornarem e a buscarem seus certificados e diplomas. As turmas, assim se heterogeneizaram, de maneira que podemos encontrar sentados lado a lado, em um mesmo módulo e curso, alunos de dezesseis e cinquenta e oito anos. Esse novo perfil, naturalmente obriga o docente a rever metodologias e mecanismos de monitoramento da aprendizagem.
A inserção de metodologias ativas deu uma importante abertura ao docente permitindo estabelecer discussões e convocar todos os alunos a uma posição operante, cooperativa e colaborativa, compartilhando e socializando informações. Brainstorming, Brainswritting, Scamper, PNI (positivo, negativo, interessante), Mindstorming, além de uma releitura dos debates, seminários e visitas técnicas monitoradas geram um momento de construção de saberes, valorizando conhecimentos acumulados de cada aluno. Esses mecanismos impulsionam a contextualização e naturalmente “prendem a atenção” do aluno, pois ele próprio vai esculpindo ou tecendo os conceitos, princípios e bases que constituirão o alicerce de seu aprendizado. Vezes muitas as Danças Circulares Sagradas, Seis Chapéus, Mapas Mentais e Método do arco vão ressignificando o processo de ensinar e aprender. Um outro ângulo no processo que extrapola os rigores da aula expositiva e dialogada.
A Resolução n.º 02, de 30/01/2012, expõe o currículo em uma perspectiva dinâmica, conforme reproduzimos:
“O currículo é conceituado como a proposta de ação educativa constituída pela seleção de conhecimentos construídos pela sociedade, expressando-se por práticas escolares que se desdobram em torno de conhecimentos relevantes e pertinentes, permeadas pelas relações sociais, articulando vivências e saberes dos estudantes e contribuindo para o desenvolvimento de suas identidades e condições cognitivas e sócio-afetivas.”
Tais meios de explorar os temas estudados também valorizam abordar um mesmo assunto sob vários olhares, favorecendo o processo de recuperação, sem recorrer-se às tradicionais provas ou a criação do famoso cenário onde “hoje é recuperação” ou “semana de recuperação”. A recuperação é o tempo todo, adentrando trilhas e descobrindo caminhos férteis de serem explorados. Se o aluno deixa de ser curioso no processo de aprendizagem, ele pouco aprende.
Teorias importantes como a das “Inteligências Múltiplas” mostra-nos uma nova forma de ver a aprendizagem e nos despertar algumas outras preocupações. Avanços da neurociência e neurolinguística também fornecem relevantes subsídios para o educador de hoje.
Há tempos se fala em gerar problematização que crie interesse no aluno, a fomentação de projetos interdisciplinares que lhe permitam romper o cerco cimentado e compartimentalizado dos Componentes Curriculares, pressupostos de uma concepção newtoniana-cartesiana, e enxergar o mundo como um belíssimo crochê, uma renda de bilros, repleto de conhecimentos consolidados pelo tempo e outros a serem questionados e outros ainda a serem descobertos, mantidos ocultos no véu da ignorância. Aguardando mãos hábeis que lhes dê luz. O professor, como tecelão de inteligências, com a agulha especial de sua sensibilidade vai produzindo os trançados para que o mais belo artesanato se materialize.
De alguma maneira ainda lidamos com o aluno reféns da etimologia da palavra. Do grego “sem luz”. Esse conceito parece abastecer e imantar algumas ideias sobre o ato de ensinar. Similar a ideia do aluno tabula rasa, de John Locke. O termo, contudo, vem do latim – alumnus – e significa “discípulo”, derivando do verbo alére, ou seja, “fazer crescer, nutrir, desenvolver, sustentar, fortalecer”. O aluno-discípulo nos propicia uma visão maior do que se tivéssemos diante de nós um ser sem luz.
O processo de ensinar e aprender, tendo muito claro que a recuperação da aprendizagem está intrínseca, nos direciona a colocar o Plano de Trabalho Docente, Plano Pedagógico ou Plano de Aula, não importa o nome que se dê, a um lugar de destaque e se faz merecedor de cuidadosa elaboração. Alguns vínculos devem ser estabelecidos. Naturalmente esse Plano ou Projeto estreita-se com o Projeto Político Pedagógico da Escola, com as orientações contidas no Plano de Curso – caso haja -, e apoia-se em diferentes legislações como a Resolução n.º 02, de 30/01/2012 que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, e uma consistente análise de indicadores e perfil da turma. Informações e dados preciosos para que o docente se aproxime do grande trabalho que busca realizar e sua reflexão sobre os caminhos mais propícios para que tenha êxito.
Obviamente, a educação não tem receitas. Inclusive, é sempre interessante pensar, que uma mesma receita de bolos, distribuída aleatoriamente, também produzirá bolos distintos. Há variáveis como o clima, a temperatura do forno, o tempo em que foi batido, a inserção dos ingredientes, além das características pessoais levando alguns a rechearem, outros não e surgem aqui diferentes recheios e coberturas. É preciso respeitar-se as características e especificidades, daí o estudo sugerido do perfil, indicadores e avaliação diagnóstica.
Um vídeo que deve ser visto e analisado pelos educadores é “Vida de Maria”, facilmente encontrado no Youtube. Recomenda-se sua reflexão. Atingimos um momento ímpar da história da educação. Mergulhados em muitas teorias de ensino e de aprendizagem, friccionados por diferentes filosofias educacionais, o docente hoje encontra – mais do que nunca – o desafio da sala de aula. Interesses diversos se movimentam no âmago da sala de aula. Alunos desejos de aprender. Alunos em busca de um diploma ou certificado. Alunos absortos e alheios ao seu próprio futuro.
Enquanto isso a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em seu inciso III, artigo 13, nos conclama a zelarmos pela aprendizagem dos alunos. Reforço que para que se alcance nosso objetivo enquanto educadores repensar práticas se faz sine qua non, permitindo releituras de metodologias e sistemas de avaliação até então adotados.
Há uma pequena estória que pode ilustrar muito bem esta situação. Certa vez um rapaz, recém casado, foi pescar com amigos e conseguiu fisgar um grande peixe. Orgulhoso dirigiu-se para casa e solicitou a esposa que o fizesse assado, ansioso em ver seu troféu exposto na mesa de refeições. No momento de saborear o peixe decepcionou-se ao ver que a esposa havia cortado a cabeça e a cauda, reduzindo-o consideravelmente e lançando fora partes que gostaria de comer. Ao ser questionada a esposa respondeu que aprendera a fazer o peixe com sua mãe e não sabia as razões de se cortar a cabeça e a cauda. Indignado o moço procurou a sogra que lhe explicou também desconhecer o motivo, pois aprendera com sua mãe. O rapaz e a moça foram então até a casa da avó a fim de esclarecer tal enigma. A senhora sorriu e disse: “É que quando me casei, tínhamos apenas uma assadeira muito pequena e como o peixe não cabia inteiro eu cortava a cabeça e a cauda”.
Em nossas práticas escolares muitas vezes o fato se repete. Não existe uma prévia intenção de causar danos, nem de se realizar um trabalho sem profundidade, o que existe é a repetição de conceitos, ideias e paradigmas em que insistimos cultuar, muitas vezes sem saber por quê, despreocupados de como ocorre a aprendizagem, como se estruturam nossos pensamentos, o que fazemos com a informação que recebemos enquanto olhamos ao professor que expõe sua aula.
Assim urge um trabalho sistematizado que de um lado se identifiquem causas e por outro aponte caminhos, viáveis e exequíveis, para a prática cotidiana do ensinar e aprender.
Quando tratamos do ensinar e do aprender, ambos não se encontram, necessariamente interligados. O docente adentra a sala, muitas vezes com a aula a seu entender muito bem elaborada, explica, fala, comenta, argumenta, expõe, insiste e chega à sala dos professores altamente realizado pela brilhante aula ministrada. Tal entusiasmo se dilui drasticamente após uma prova escrita, por exemplo. Ele estava tão ansioso na busca do ensinar que se esqueceu do laço com o aprender. E o laço se alarga ainda mais quando pensamos do processo de recuperação.
Nosso processo de ensinar, nada mais é do que um contínuo processo de aprendizagem. O educador de hoje está modelando um novo processo educacional. Está revendo formas, descobrindo cores, recuperando valores, talhando uma maneira inusitada de ensinar amparado pelas novas bases dos mecanismos de se aprender.
Podemos citar como extremamente atual uma das sábias frases de Confúcio ”o que eu ouço, eu esqueço; o que eu vejo, eu lembro; o que eu faço, eu aprendo”. Talvez as duas pontas que estejamos tentando unir, com tantas dificuldades, estejamos segurando em nossas mãos.
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