segunda-feira, 26 de março de 2012

O MILAGRE DOS GERÂNIOS



         Os jardins traduziam uma inequívoca sensação de paz formando um extenso tapete de gerânios floridos. A brisa suave trazia o aroma de suas flores recentemente banhadas pelo orvalho. Os aldeões já desfilavam desde o alvorecer em suas rotinas diárias. Um cheiro de pão assando nos fornos de barro se misturava ao perfume dos gerânios, da serragem e a lama dos chiqueiros onde gordos porcos remexiam os restos de tubérculos destinados a eles. A população caminhava num ambiente extremamente pobre para alguns e estava inserida em um lugar rico e próspero onde a natureza lhes oferecia o suficiente para viverem seguros e tranquilos.

            Logo ao pé da colina, um tanto afastados, residia um casal e sua filhinha que já completara cinco anos. Seus cabelos negros, cacheados, o olhar curioso e o sorriso meigo era um presente celestial que os pais agradeciam a cada manhã e a cada por do sol. Kefud era um homem solitário, criado com a rudeza de seu pai, proibido de exteriorizar sentimentos e preocupado com o sustento da família. Seu coração amava sua esposa Sorene e sua filha Zina, mas não demonstrava, fechava-se em si mesmo, cerrava as sobrancelhas e deixava sua alma deleitar-se com o que sentia. Seu sonho era enriquecer como os nobres que passavam em seus luxuosos cavalos pela aldeia e cuidar de Zina como uma princesa.

            Não distante dali morava uma outra família já com seis filhos em uma modesta casa de pau a pique, rodeada de pés de abóbora, donde se fazia uma cheirosa cambuquira ou sopas perfumadas. Um dos meninos, com a idade aproximada de Zina, logo passou a ser frequentador assíduo da casa. Chamava-se Luan. Assim cresceram juntos, correndo pelos campos, escalando as mangueiras e driblando os quero-quero em permanente alegria.

           A vida dessas famílias teria uma reviravolta muito grande naquela manhã em que Kefud escalava as colinas atrás de um coelho. O coelho cinzento e gordo atraiu cuidadosamente o homem para sua toca. Na verdade um buraco de pelo menos cinquenta centímetros quadrados. O buraco parecia fundo e abria-se gradualmente. Percebia que dentro uma mina formava um pequeno córrego. Esgueirou-se como pode e escorregou para dentro do túnel úmido e escuro. O odor denunciava que ali também residiam morcegos e logo confirmou suas reflexões quando um bando deles agitou-se sobre sua cabeça.

              Ao fundo da estranha toca acreditou ver um pedestal onde se encontrava um baú de madeira, muito bem talhado e antigo. Arrastou-o como pôde para fora, machucando as mãos com grandes cortes e arrastando-se pelas pedras pontiagudas espalhadas pelo chão da estreita gruta. Sob a luz do sol as moedas douradas refletiram sua descoberta. Estava rico.

           A riqueza revelou um lado oculto de Kefud e Sorene. Compraram terras e construíram um verdadeiro palácio. Afastaram-se da gente pobre da aldeia e proibiram que Zina continuasse se encontrando com Luan. Tornaram-se arrogantes, frios e distantes, como se uma amnésia os fizesse esquecer de todos os bons momentos vividos, as amizades, as muitas vezes que buscara a mãe de Luan e retornara com uma bela abóbora para conseguir alimentar a si e sua família.

        A proibição, naturalmente, obrigou os adolescentes apaixonados a buscarem criativamente condições de se verem. Cada momento tornou-se intenso e precioso. Um passeio pelo pomar da residência, a ida ao mercado com a austera e intolerante Alfreda, quase uma guardiã de Zina, o momento da missa e o diálogo com o mercador de tecidos, um dos disfarces de Luan.

        Alfreda mostrava-se sagaz e terrível, nada parecia enganá-la ou iludi-la, sempre extremamente fiel aos mandos de Sorene. Sorene tornara-se uma mulher masoquista que fazia cada serva sofrer, através de sistemas engenhosos de humilhação e desprezo. Alfreda, muitas vezes, era sua pesada mão.

          Vendo a impossibilidade de isolar os dois amantes, Kefud julgou melhor interná-la em um convento. O convento de Nossa Senhora da Estrela, conhecido como Aurora da Salvação, onde meninas eram levadas para terem boa educação ou para os fins similares ao de Zina. As muralhas a protegeriam.

         Logo nas primeiras semanas foi possível Luan subir os muros, arranhar-se nas roseiras e falar com Zina, até que Irmã Lucrécia a denunciasse.Desde então passou a ter uma vida mais rigorosa, com horários inflexíveis, orações, mortificações e trabalho físico, limpando as imensas instalações, carregando lenha e capinando a grama. As lágrimas, a dor, a saudade e a tristeza passaram a ser suas amigas. Apegou-se a oração e tornou-se humilde e submissa. Irmã Dorotéia a espezinhava, ofendia, agredia e testava seu silêncio a todo custo. Zina, porém, respondia com frases utilizadas por Jesus. Algumas freiras diziam que era uma santa, pois uma pessoa normal não suportaria tantas provações.

           Além dos muros, Luan esperava por Zina. Sofria e acreditava encontrar um meio de retirá-la daquele lugar e viverem a felicidades que se prometeram durante anos. Tamanho seu sofrimento que foi tomado por estranha febre ficando acamado, definhando a olhos vistos e tendo momentos de delírio onde a própria Virgem anunciava que a tiraria de lá e traria para ele.

          Zina, coberta de palidez, magra e exausta, não resistiu, sendo dominada pela peste cinzenta que levava dezenas de pessoas para as sepulturas.

         O dia estava frio e um vento gélido parecia querer talhar como lâmina a pele das freiras. Sem abalar-se, seja com o frio, seja com a morte de Zina, Irmã Dorotéia mandou enterrá-la no jardim e determinou que fossem avisar Dona Sorene. Estranhamente, ao raiar da manhã a cova estava coberta de gerânios floridos.

          Algumas madres encolheram-se na capela em oração, entre assustadas e encantadas com o fenômeno.

       A mãe da menina pareceu cair em si naquele instante, perturbada, fitando a mensageira com olhos esbugalhados e agressivos. Tocou a madre como se enxotasse um cachorro de sua propriedade. Subiu as escadarias como louca até chegar ao terraço de onde fitava o convento e tornava-se mãe, deixando-se sentir a ausência de Zina. Ali sentou-se e permaneceu o resto de seus dias, com o olhar fixo, meio morta e meio viva, sem expressão, como uma múmia fitando o poente.

            Kefud, como sempre cuidou para que os sentimentos fossem enterrados na mesma sepultura que Zina, para assim manter-se firme, dono de si, simulando ignorar sua consciência. Arrastou-se, contudo, para junto de amantes e sua riqueza foi sendo dilapidada até quase nada restar. Magro e transtornado, já sem forças, pelejou pela escada até aproximar-se de Sorene, muda e morta. Era outro homem, sujo e maltrapilho. De lá saltou pondo fim ao mal que o consumia.

               Luan levantou-se com dificuldade para olhar o céu, onde via os olhos brilhantes de Zina. Imerso em seus sonhos sentiu as mãos leves e suaves da moça tocarem seu ombro. O perfume de gerânios o fez buscar os tempos de infância, o primeiro beijo, o primeiro afago. Olhou-a com alegria e incompreensão. Logo viu-se abraçado com Zina caminhando pelo infinito jardim de gerânios, poderiam estar juntos agora, para sempre.

            Diante da cova, coberta de flores, um grupo de pessoas rezava o terço buscando uma benção, um olhar amoroso de Zina, quem sabe um milagre.

domingo, 25 de março de 2012

HÁ MUITAS FORMAS



há muitas formas se ser
de viver, de perceber onde está
de perceber-se, experenciar
há muitas formas de saborear a vida
de entender as despedidas
de saber reencontrar
há muitas formas de enxergar-se
no turvo espelho da existência
onde há tantas falas, olhares e evidências
tantas variáveis, tantas cenas,
tantos personagens, tantos epílogos
há tantas formas curiosas de se defender, se proteger, se ocultar,
mas há mil maneiras de se mostrar
de se firmar, de se encontrar,
também, não duvide,
há muitos caminhos para se perder.
há caminhos retos e intermináveis,
há atalhos e caminhos tortuosos,
de terra, de asfalto, de seixos.
há caminhos de água
que serpenteiam como um rio
há caminhos que somente o vento sabe trilhar
há caminhos de ouro
luxuosos e iluminados
mas há os caminhos na lama
com importantes significados
há muitas formas, muitos corpos, muitas cores
solitários ou repleto de amores
há aqueles recheados de dores
caminhos afoitos, caminhos seguros,
há quem não consiga dar se quer um passo no caminho
há muitas formas de se viver cada dia.

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ENTRE SEPULTURAS

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Gosto de caminhar entre as tumbas. Posso passar horas desfilando entre elas. Lugar certo de todos nós. Enquanto caminho absorto entre elas aprecio observar as fotos, as expressões e através delas tentar advinhar a vida, as expectativas e o fim de cada uma daquelas pessoas. Alguns rostos estampados nas fotos denunciam a serenidade, a forma de vida, a juventude ou a velhice, a vaidade e a pobreza. Assim como nós cada uma daquelas pessoas enfrentou a incerteza do dia seguinte e muniu-se de esperanças para enfrentar o porvir.

Algumas fotos, enriquecidas pelo que foi deixado na sepultura demonstra o estilo de vida, algumas vezes objetos pessoais e as crenças que sustentaram sua presença no mundo dos vivos. Mas ainda, no silêncio de seus túmulos, falam de si mesmas. Contam estórias. Narram episódios marcantes, decepções, tristezas, depressões e a permanente vida nas lembranças ali deixadas.

Entre as sepulturas lemos depoimentos marcantes e emocionados daqueles que ainda ficaram, flores, velas, presentes. Outras esquecidas, atacadas por vândalos, um ciclo que foi terminado efetivamente.

Pessoas que deixaram os familiares extremamente jovens, cheios de vitalidade, e outros já desgastados pelo tempo, pelas desilusões, pelo abandono. Gosto de fitar seu olhar e intimamente conversar com cada uma delas. Os diálogos são carregados de fortes e inesquecíveis ensinamentos. Faz-nos pensar sobre nós, enquanto viventes, e refletir sobre nossos desejos, nossos sonhos, nossas atitudes e nosso futuro. Em um ponto do futuro estaremos ali ou seremos cremados. Existe ainda a possibilidade de um corpo desaparecido no mar ou oculto no solo da floresta. De qualquer forma há uma estação em que devemos descer do trem, sem malas, sem bagagens, mas imantados de inúmeras lembranças.

São as lembranças que carregaremos conosco. O que semeamos em nossas searas, o que espalhamos em nossos caminhos. E esse é um momento muito íntimo porque não há plateia e não havendo público, desnecessárias são as máscaras, as mentiras, as articulações, as aparências, as encenações. Somos nós e nós diante do inevitável encontro com o que realmente somos.

Em um reencontro doce ou amargo com nossa essência. A morte. A morte é a grande conselheira do homem, amiga, companheira fiel, que pacientemente aguarda o momento em que deve bater o sino anunciando a estação que vamos desembarcar. Se existe vida, a morte é sua irmã gêmea. Por mais que as crenças delinearam caminhos para o que será após atravessarmos o portal da morte, ela ainda é a certeza e o semáforo que nos orienta e ensina. Ensina acima de tudo nossos valores.

São eles a moeda utilizada no porvir. Há quem tenha moedas mais valiosas, outros menos. E certamente tanto aqui como acolá há paupérrimos e milionários.

Não acredito em julgamentos. Não precisamos deles. Temos um sensor poderoso chamado consciência. Ele não se corrompe, não interpreta, não engana. Há um espelho íntimo onde podemos nos olhar sem nos iludirmos ou elaborarmos um complexo sistema de justificativas para nossas ações e reações. Sempre sabemos o certo e o errado, o bem e o mal, mesmo que tantas e inúteis vezes tentemos nos isentar.

Mesmo que, por medida de segurança e proteção, eu não acredite na vida após a morte, com a morte certamente iremos nos encontrar.

Por isso, caminho entre as sepulturas. Espantosamente reveladoras.

PANO BRANCO


nasci da fria gota do orvalho da madrugada
com o passo suave dos felinos
e o leve voo da coruja em sua ronda
da vida quero pouco ou quero nada
quero caminhar em redemoinhos
pelas montanhas, campos e ondas
no mar aberto em seu cheiro
de alfazema, algas e macaçás
quero seguir na vida como um cigano
saboreando cada paragem
seguindo as estradas, rodovias e manguezais
ver encantando o voo da garça e do tuiuiú
as cores das flores que brotam solitárias
as borboletas impacientes em cores coloridas
ver os cães que latem e não me importar
brincar com seu jeito zangado

a vida passa como o vento
o mesmo sopro que um dia sopraram e que deu vida
é sugado, tragado e devolvido
para compor a brisa pura da manhã

a terra é farta, bela, encantadora
selvagem e tantas vezes incompreensível
mas assim é a própria vida
do mesmo solo de onde brotam a doçura
nascem frutos amargos
as folhas macias
e os cardos

nasci ao germinar da manhã
do sol que se alevanta e reaquece
aconchega, abraça, beija
seca, murcha, mata

nasci batizado pelo orvalho
pela pureza do igbin
as brumas brancas
como algodão
nos braços de Oxalá

sábado, 24 de março de 2012

FLOR DA MORTE


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flores comestíveis que saboreio em teus lábios
mudos e puros com cheiro de crisântemos
lábios arroxeados e entreabertos
que não mais sopram, não mais beijam

toco tuas mãos úmidas e frias
que não mais me acolhem ou acariciam

os céus nublados marcam o epílogo
de uma vida pausada e inútil
inúteis foram seus dias
despercebida sua ausência
calada sua despedida

há muitos lábios que sorriem
mesmo certos de que estarão calados
um dia

vale a satisfação de tua mudez
de teu silêncio impávido

o prazer da despedida

guardei uma rosa para isso.

segunda-feira, 19 de março de 2012

VOZ SECRETA

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uma voz me fala ao longe
é a minha voz que fala
é uma voz distante
que não reconheço
uma cantiga monótona
uma reza angola
cadenciada e pura
Dandalunda que me chama
é a voz da chuva
é a voz das águas
sou eu quem me chamo
que clamo minha atenção
ritmado pelo pulsar do meu coração
é o chamado oculto de minh´alma
minha alma em tons azuis e violeta
nos tons do mar
uma voz me fala ao longe
um canto que vem da África
dos tambores daqueles que atravessaram o mar
é minha voz que fala
sonora e muda
quieta em meu silêncio

domingo, 18 de março de 2012

JACARANDÁ MIMOSO


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                      As folhas secas insistiam em adentrar a varanda da casa trazidas por um vento persistente. Diante da casa o jacarandá mimoso exibia suas flores arroxeadas, aliás toda a rua em sua longa extensão era ornamentada por essa árvore. A visão era belíssima na época de seu florescer. E foi nesse cenário que cresci. A casa já pertencera a minha avó Mafalda e com seu falecimento foi herdada por minha mãe. Uma casa repleta de estórias da família. Na época de minha avó a casa era bem mais movimentada. Lá moraram também meu avô Celestino e meus tios Chico e Januário. Chico gostava de escrever poemas zelando pelo rigor das rimas e estribilhos, pegava o lápis e deixava a mão percorrer o papel que embrulhava o pão. Então guardava na gaveta de seu criado-mudo cada emanação de sua alma quase sempre turbulenta, triste e lamentosa.

                       Januário era homem da roça, pegava o caminhão de turma com seu embornal a tiracolo, sua marmita e saía para colher tomates, limões, goiabas conforme a época e as safras. Gostava daquilo. Após o trabalho apreciava uma branquinha. E apreciou tanto que passou a saboreá-la progressivamente mais vezes ao dia até abandonar a colheita e encontrar-se pelas sarjetas.

                        Enquanto Chico era recatado, preso em seu silêncio e poesia, Januário era extrovertido, cheio de contar estórias e mulherengo sendo-lhe atribuída a paternidade de muitas crianças em diferentes pontos da vila. Minha mãe era a caçula, Verônica, assim batizada por ter nascido em uma Sexta-feira Santa e em homenagem àquela que limpou o rosto de Jesus.

                        Apesar da época minha avó mostrava-se revolucionária e altamente feminista, inclusive na religião católica que seguia a seu modo. Segundo ela o trabalho de Jesus não fora evidenciado pelos doze apóstolos, mas por figuras femininas delicadamente olvidadas pela Igreja. Sempre nos reunia para falar sobre isso. Dissertava longamente sobre a importância delas com a Bíblia nas mãos e abrindo-a solenemente repetia “ ...e Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes, e Susana, e muitas outras que o serviam com seus bens”, em Lucas 8:3. A citação “e muitas outras” a perturbava, dizia que se fossem homens seriam citados um a um. Dizia que essas mulheres o patrocinaram e sem elas nada teria atingido as proporções que tomaram a divulgação da crença.

                          Em outros momentos falava de Maria Madalena ressaltando João 19:25 “ e junto a cruz de Jesus estava sua mãe, e a irmã de sua mãe, Maria, mulher de Clopas, e Maria Madalena”. Questionava em que lugar estariam escondidos os homens. Depois relatava a aparição de Jesus a Maria Madalena. Na sala da casa havia um quadro onde se via a cena da aparição, onde Madalena exclamava “Raboni !”.

                          Falava de Verônica e sua lição de humildade. Traçava sérias críticas ao próprio Jesus relacionando trechos onde ele se dirigia aos apóstolos com frases ofensivas e depreciativas como “ raça de víboras, como podeis vós dizer coisas boas, sendo maus? em Mateus 12:34, e outras similares em Mateus 3:7 e 23:33, Lucas 3:7, chegando ao ápice quando rejeita a própria mãe. Ela se exaltava e dizia que as pessoas deveriam ler melhor a Bíblia.

                           Mas Dona Mafalda era uma boa mulher, acolhendo os vizinhos como mãe e ajudando a todos que podia com alimentos, roupas ou uma palavra amiga.

                           Um dia ela encontrou Chico dependurado na rancho no fundo da casa. Aparentemente sem motivos. Deixara na gaveta suas poesias. Levaria consigo seu segredo. A verdade é que Chico nutria sentimentos que considerava anormais e diabólicos. Estava sendo tentado. Um sentimento que provocaria a ira e a incompreensão de sua mãe, de Januário e de sua irmã Verônica. Sentia algo estranho por Rodolpho, filho do dono do armazém da esquina. Diante da impossibilidade de externar seus sentimentos e ser compreendido, preferiu dar fim a sua estória. Os poemas apaixonados demonstram uma paixão secreta, mas onde se lia “ela” em seus escritos, devia-se ler Rodolpho.

                           Januário bebeu todas as beberagens possíveis que diziam para Dona Mafalda que combatia o álcool, de coração de galinha preta torrado a rezar o Salmo 87, simpatias e benzedeiras. Nada ! Um irmão de Mafalda, Tibério, e alguns primos viviam vitimados por isso. A maioria morria em razão da bebida.

                          Meu pai morreu cedo em razão de uma explosão na pedreira. Trabalhava lá e foi atingido por uma rocha bem na cabeça. Eu tinha cinco anos. Minha mãe não quis arriscar-se a outro casamento. Dedicou-se a sua carreira de professora e a mim. Cresci entre livros e totalmente desinteressado por eles, embora como meu tio Chico gostasse de rabiscar no papel alguma poesia.

                           A influência maior, contudo, foi de meu tio Januário e sua vida boêmia. Comecei a sair cedo com amigos e a descobrir os muitos prazeres trazidos pelas bebidas, mas fui tragado pelas drogas, experimentando e experenciando cada uma delas. Os confrontos em casa passaram a tomar grandes proporções, tendo a suprema compreensão de minha mãe Verônica.

                           Quando o dinheiro escasseava acabava fazendo programas com homens mais velhos. E assim conheci Aderbal á com seus cinquenta anos e se apaixonou por mim. Era uma fonte inesgotável. Roupas, tênis de marca, pulseiras e correntes de ouro – que muitas vezes eu comercializava em troco da droga – ou dinheiro que recebia por meu carinho e dedicação.

                           Enquanto ainda saía com Aderbal conheci Mônica, uma pessoa maravilhosa e que decidiu me tirar do submundo das drogas. Naturalmente ela não sabia de outros relacionamentos que eu cultivava em especial com homens que me pagavam muito bem.

                          O dia que me abalou foi saber que Aderbal havia se suicidado com uma bala na boca. Havia perdido tudo. Diante da minha consciência procurei justificar que isso era problema dele, que ao invés de me dar dinheiro e bancar alimentara meu vício. Enfim virei o jogo para minha tranquilidade interior.

                           Passadas algumas semanas outra notícia que me desarvorou completamente. Um acidente de carro envolvendo Verônica e Mônica. Estavam mortas. As dívidas no Banco, com empréstimos feitos por minha mãe, levaram a perda da casa. Procurei inutilmente meus antigos parceiros, mas eles queriam o rapaz bonito e perfumado de outrora, e agora eu era morador de rua. Pela primeira vez senti muita falta de Verônica, Mônica e Aderbal, imagens de minha infância emergiam aos borbotões suaves e acusatórias.

                            Sentado na praça com muita fome, esquálido, e em busca de algo que fizesse a dura realidade extinguir, uma cigana se aproximou, sentando-se ao meu lado. Olhou-me piedosamente e entregou-me uma baguete.

                           - Há dois espíritos que te acompanham, seus parentes, chamam-se Januário e Tibério que te levam ao vício. Um senhor de cabelos alvos e sangrando pela boca, cujo nome não consigo entender, clama por vingança. Você deve ir a igreja e oferecer uma missa a eles. Peça que te perdoem e que se afastem...ou o pior ainda está por vir.

                          Sem mais palavras ela afastou-se, juntando-se a outras ciganas que interceptavam os transeuntes oferecendo-se para ler a mão.

                         Entrei na igreja após confirmar que todos já estavam lá dentro, caminhei quieto para não ser notado, envergonhado pelo meu cheiro e meus trajes, sob o olhar de águia do sacristão. Ajoelhei-me e pela primeira vez chorei copiosamente. Mas ao sair aproveitei as moedas para comprar drogas.

                         No delírio em que entrei vi minha mãe Verônica aproximar-se como se quisesse me abraçar. Despertei com um enorme cachorro preto dormindo do meu lado. Ele passou a acompanhar-me onde quer que eu fosse.

                          As humilhações na rua eram grandes. Cada lixo que eu remexia em busca de alimento me reportava aos apetitosos almoços que minha mãe preparava. O que conseguia dividia com meu fiel cão Ecstasy.

                           Sentei-me nas areias mornas da praia ouvindo o mar, a lua brilhava desafiando as luzes da cidade. Para meu espanto Ecstasy tomou a forma de Mônica. Olhou-me ternamente como sempre e segurou forte minha mão e seguimos sobre as ondas, dizendo que tudo estaria resolvido. Sobre as ondas as pétalas do jacarandá mimoso resplandeciam, era uma chuva de pétalas. Caminhamos em uma infinita estrada rodeada por estas árvores floridas e cintilantes.

                             Alguns dias  depois localizaram meu corpo boiando próximo as pedras, sendo chicoteado pelas ondas.

domingo, 11 de março de 2012

SEREIA DO MAR



eu ouvi o mar
a insistência das ondas
o canto sedutor da mãe d´água
enquanto caminha sobre as águas
nas noites de lua nova
coberta de algas e espumas

eu vejo o mar
em sua realeza
coberto de belezas
no território de Iemanjá

caminhei sobre a areia
procurando a sereia
para lhe ofertar flores
alvas, brancas
cheiro de lavanda
no fundo do mar

Janaína me ouviu
Uma onda me seguiu
as flores foram para alto mar
onde já não posso mais avistar
terreno sagrado de minha senhora
que um dia irei visitar.



MAL FEITO


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         Faz sete anos que Elisa faleceu, dentre eles três em que definhou misteriosamente. Diariamente venho ao seu túmulo, trago flores novas, às vezes abro um vinho, o de sua preferência, espumante e doce e juntos o saboreamos. Algumas vezes a vejo ou a ouço em nossa casa. Na cozinha onde gostava de ficar preparando sempre um prato novo ou apenas sentada ouvindo música. A ouço cantar, mexer nos pratos e panelas, empurrar cadeiras. Parece preferir ficar distante do quarto onde por meses a fio sofreu dores alucinantes, disfarçando-as com submisso sorriso e um olhar que buscava ser alegre entre as lágrimas que escorriam.

Conheci Elisa no caminho do trabalho. Com chuva ou sol eu buscava o ponto de ônibus rumo à fábrica de calçados. Em um dia chuvoso e frio, o ônibus lotado, parecendo que todos haviam decidido naquele dia fazer uso do circular, ajeitei-me como pude, empurrando um e outro e me acomodando nos restritos espaços disponíveis. Na parada próxima ao hospital uma moça desesperou-se quase impedida de chegar à saída. As pessoas não lhe davam espaço para passar, apesar de suas rogativas. Auxiliei-a, algumas vezes mal educadamente, pois algumas pessoas não se tocavam. Ela agradeceu-me apressada.

Nunca mais a vi até ferir-me na fábrica. Levado ao hospital fui atendido por ela, enfermeira de plantão. Conversamos bastante, rimos daquele dia no ônibus, falei sobre a produção de calçados femininos e de alguns modelos que iria gostar. Interessou-se em conhecer a fábrica, embora eu acreditasse que sua fala fosse apenas gentileza enquanto ela dava alguns pontos no meu braço. Mas não foi simples promessa, em um final de tarde foram me chamar dizendo que estava sendo procurado por uma moça. A moça era Elisa. Apresentei-lhe todos os setores e combinamos jantar. Havia uma pizzaria muito boa e ela declarou ser apaixonada por escarola. Nessa noite, pela primeira vez, tomamos um vinho juntos. O vinho que seria o símbolo de nossa união.

A partir desse dia intensificaram os encontros, os telefonemas e eu lhe remetia flores uma vez por semana. Gostava de flores de tons azulados ou arroxeados. Muitas vezes eu rodava a cidade toda em busca de uma flor que pudesse traduzir tudo o que sentíamos um pelo outro. Em uma das vezes enviei-lhe um colar de turquesas, belíssimo. Após ele, o noivado. Uma festa familiar, com poucos amigos, mas muito alegre. Um sonho que se materializava tão cheio de felicidade que parecia ser impossível estar acontecendo.

O casamento foi na Capela de Santo Ângelo, rodeada por um jardim de camélias, esporinhas e rosas. Viajamos para Roma. Elisa falava muito bem o italiano. Uma língua que apreciava. Ouvia suas músicas, cantarolava enquanto trabalhava em casa.

Pouco tempo depois nasceu Bertoldo, nosso menino. Bertoldinho. Ela apressou-se a ensinar-lhe as duas línguas. Como havia sido promovido e estava tendo um salário razoável, Elisa preferiu ficar junto de Bertodinho e deixou o hospital.

As coisas caminhariam bem se não fosse Rosa. Rosa era uma moça muito bonita, ambiciosa, dedicada no trabalho e que acreditou estar apaixonada por mim. Enviava cartões e presentes que eu procurava não aceitar e esclarecê-la que deveria procurar outra pessoa, alguém que gostasse dela, mas Rosa estava estranhamente fixa na ideia de que se casaria comigo. Disse uma vez que bastaria um filho. Rosa buscou tornar nossas vidas um verdadeiro inferno. Fazia ligações para Elisa, interceptava-nos quando saíamos para jantar em algum restaurante, ameaçava-me.

Para dar um basta nisso encontrei um meio de despedi-la da fábrica. Falei longamente com ela e adverti que não mais se aproximasse de nós, em especial de Elisa. Rosa deixou o escritório transtornada, em prantos e avisou-me que minha felicidade terminava ali, naquele momento.

Daquele dia em diante começamos a encontrar coisas na casa. Uma oferenda com mariscos no portão de casa, uma bonequinha de pano cheia de cabelos de Elisa e espetada de alfinetes, um gato preto morto dilacerado e tendo fincado nele o nome de Elisa. Entendemos que Rosa buscava nos aterrorizar, pressionar, invadindo nossa casa sem ser vista e deixando recados ameaçadores através de objetos que postava nos mais surpreendentes lugares. Vultos passaram a ser vistos pela casa, ruídos durante a madrugada, gargalhadas que rompiam o silêncio e a tranquilidade de nosso lar. Algumas árvores secaram sem motivo aparente e com uma rapidez inacreditável.

Elisa solicitou que o Padre Edmundo fosse benzer a casa. Confiava nele. O Padre almoçou conosco, esclareceu que se tratava apenas de pressão psicológica e que acreditássemos em Deus e não naqueles objetos que nenhum mal poderiam nos fazer. Naquela noite dormimos serenos, sem qualquer acontecimento anormal. Estamos certos de que as bênçãos haviam exorcizado quaisquer energias negativas que pudessem estar circulando pela residência.

Fomos chamados ao colégio, em uma tarde, com a informação de que Bertoldinho havia se machucado. Tinha caído do escorregador e quebrado o braço. Mas eram coisas que poderiam acontecer a qualquer criança hiperativa.

Na madrugada, contudo, Elisa despertou com fortes dores abdominais. Essas dores se ampliariam e acompanhariam Elisa até seus últimos dias. Exames inúmeros, visitas a diferentes clínicas e pareceres contraditórios dos médicos. Não se identificavam as causas das dores e emagrecimento contínuo de Elisa. A cada dia uma palidez parecia cristalizar-se em seu rosto, os olhos foram se tornando opacos e o sorriso difícil de emergir de tanto sofrimento.

Procurei Rosa. Pedi que me perdoasse, mas não a amava e se ela tivesse feito algum mal a Elisa que fosse desfeito, ela não tinha culpa do fato de eu não gostar dela. Rosa contou que sustentava a família e que perder o emprego levou a todos a uma série de privações. A mãe já idosa não resistiu a falta de comida, morreu de fome. Sua irmãzinha passou a prostituir-se para ganhar um pedaço de pão. Reafirmou que eu não seria mais feliz e Elisa morreria. Ofereci-lhe dinheiro, jóias, o que desejasse para parar com essa vingança, mas Rosa disse que apenas iria desfazer o que havia feito se fôssemos para a cama.

Saí da casa paupérrima de Rosa com um imenso nó na garganta.

Dias após Elisa recebeu a fita com as imagens do que acontecera comigo e Rosa. Elisa manteve esse segredo. Somente depois de muito tempo da morte dela é que a encontrei escondida em sua caixinha de lembranças. A preservara sem nunca tocar no assunto.

Um suspiro mais profundo e Elisa deixou este mundo fisicamente. Mas ainda continua comigo, talvez tenha me perdoado pela traição, entendendo que buscava um meio de tirá-la daquele sofrimento. Não sei de Rosa, disseram-me que havia viajado, ido embora em busca de parentes distantes.

Bertoldinho  parece feliz. É estudioso, dedicado e quer cursar medicina.

Hoje trouxe hortênsias para Elisa. A tarde está clara com um leve rosa no horizonte. No túmulo ao lado, tanto quanto eu uma moça parece não se esquecer de seu falecido marido. Chama-se Lúcia Helena. Tem o jeito meigo de Elisa. Alguma coisas parece nos atrair um para o outro.

- Vejo que você, eventualmente, deixa aqui uma garrafa de vinho. Sua esposa tinha bom gosto...também aprecio muito essa marca – comentou ela olhando-me com um leve sorriso.

sábado, 3 de março de 2012

O SEGREDO


http://fotosbossini.blogspot.com

Esta é a vida de Sebastião. Sebastião chegou ao vilarejo com cerca de oito anos de idade. A família o mantinha com sua tradicional bermuda pouco abaixo dos joelhos com suspensório, camisa e headwear, meia e sapatos. Um menino de poucas palavras, que brincava pouco. Os pais muito rígidos o mantinham quase que em cativeiro na grande casa da esquina.

A casa pintada em tons de terracota era bastante arborizada, na verdade quase uma floresta onde a família se mantinha isolada, de poucos amigos e nada hospitaleira. Levavam Sebastião até a entrada do colégio e iam buscá-lo, mantendo-o quase intocável. O colégio, dirigido por padres, mantinha o rigor severo da disciplina, portanto entre seus muros os pais podiam ficar despreocupados. Nesse estilo de vida, Sebastião aprofundou-se na leitura, os livros substituíram os amigos e através de seu destaque escolar sobrepujou-se aos colegas, garantindo assim o título de “crânio”, dispensando-o de uma série de outras atividades e justificativas para seu comportamento distante e tímido.

Aos doze anos estava trabalhando na loja de tecidos do “Seu” Bady, inicialmente como entregador, depois como vendedor e não demorou para estar auxiliando nas compras e contabilidade.

- Esse menino é um gênio !, exclamava o homem satisfeito e assombrado com o ágil raciocínio do rapaz e habilidades no cálculo.

O menino realmente possuía uma memória incrível, além da chamada memória fotográfica. Lembrava-se com detalhes dos acontecimentos e pessoas. Essa habilidade encantava os clientes que rapidamente eram reconhecidos e chamados pelo nome, mesmo que tivessem estado na loja apenas uma vez.

Os outros funcionários da loja, Tadeu e Darcy, o incomodavam falando sobre sexo e garotas. Mas Sebastião deslizava habilmente saindo de cena. Os rapazes questionavam se ele queria ser santo e essa probabilidade era grande. Do bolso da bermuda sempre pendia um crucifixo. O menino conhecia os santos e sabia narrar a vida deles com propriedade. Participava das missas e por vezes apontava o desejo interior de ser monge, com voto de silêncio, pobreza e castidade. Mas tratava-se de mero desejo, não totalmente introjetado e rejeitado pelos pais.

Em uma noite em que precisaram avançar até altas horas em razão de uma grande encomenda, Tadeu e Darcy resolveram aplicar uma peça no garoto e articularam levá-lo até a casa de Nelcy. Nelcy era bem conhecida na cidade e possuía um barzinho em uma estradinha de terra afastada da cidade. Sebastião não imaginava que seria levado para uma zona. Inocentemente chegou ao local. Estranhou a pouca luminosidade e a rusticidade do lugar que tanto foi elogiado a ele.

Darcy, já bastante conhecido da casa, fez sinal a uma das meninas de Nelcy, apontando para o novato. O calouro da noite. Um rapazinho virgem entregue nas hábeis mãos de Priscila. O menino foi levado gentilmente para o interior, enquanto Darcy e Tadeu pediram um conhaque. Sempre começavam com um conhaque.

As horas passaram de maneira que os dois amigos se empolgaram. Sebastião devia ter gostado da coisa.

- Nunca comeu melado, agora que comeu deve estar se lambuzando...comentou sorridente Tadeu.

Resolveram ir até o quarto e surpreenderem a estréia do rapaz. A surpresa, no entanto, foi deles. Sebastião, sentado na cama, completamente vestido, de boina, conversava animadamente com Priscila. A moça ainda volta-se para os dois e diz “nossa, ele é ótimo !, traga-o mais vezes aqui...”.

- Pelo menos ele não estava rezando no quarto !, protestou Darcy disfarçando a imensa decepção que caíra sobre ele.

- A Priscila é uma pessoa adorável, quero vê-la outras vezes – revelou Sebastião com uma irritante inocência.

A pressão sobre Sebastião passou a não ser tão grande, convenceram-se de que ele deveria ser padre mesmo. Mas Darcy ainda não se dera por convencido. Era uma questão de honra levá-lo a um puteiro e vê-lo entregar-se aos prazeres carnais, mesmo que tivesse de embebedá-lo.

Dessa forma, Darcy o importunava eventualmente com o objetivo de constrangê-lo. Por vezes fazia questão de exibir seus órgãos genitais ao rapaz, observando atentamente a reação. Sebastião sempre tinha um comentário zombeteiro que deixava Darcy completamente desajeitado e sem resposta. “Ele tem tudo na ponta da língua !”, esbravejava inconformado.

Mais uma tentativa e Darcy combinou com Tadeu dar um porre no jovem. Saíram para o bar do “Seu” Nelson, bem no centro do vilarejo. Assim Sebastião se sentiria mais confiante e confortável. O desafiaram a tomar uma branquinha e logo estavam iniciando uma propositada competição. Uma, duas, três e Sebastião já começou a enrolar a língua, a falar mais e rir muito. O carro de Tadeu aguardava o momento de levá-lo novamente para a casa de Nelcy. Tudo correria bem se Sebastião não tivesse ido ao banheiro e não retornado mais. Encontraram-no dormindo e roncando aos pés do tamarineiro no fundo do estabelecimento. Não houve quem o acordasse. Deram-lhe um café forte e levaram para casa.

Como o movimento da loja crescia, “Seu” Bady contratou para trabalhar um seu sobrinho recém chegado. O rapaz de olhos amendoados, pele bronzeada, sobrancelhas fechadas e aveludadas chamou a atenção de Sebastião. Chamava-se Khalid. Por alguma razão a presença de Khalid fazia Sebastião ficar inseguro, trêmulo e com escassez de raciocínio. Evidentemente, aprimorou-se na arte de disfarçar essas reações exceto do próprio Khalid que logo identificou a mudança de comportamento, o baixar os olhos de Sebastião em sua presença. Curiosamente havia uma estranha satisfação nisso, por essa razão abraçava Sebastião quando estavam todos juntos na loja, porém evitava ficar sozinho com o moço.

Sebastião começou a pensar em deixar a loja, buscar outro emprego, mas não havia justificativa para isso. Com absoluta certeza deveria dar satisfações aos seus pais, ao “Seu” Bady e os colegas Tadeu, Darcy e Khalid.

Nesse ínterim, a família de Sebastião foi procurada pelos Anzol Moreira, Sr. Demerval e Sra. Ernestina, que desejavam arranjar o casamento entre o moço e sua filha Zoé. Zoé recebia tratamento similar ao de Sebastião, estudando em colégio de freiras e tendo uma vida recatada e distante dos burburinhos de uma sociedade perdida. Os pais de Sebastião foram evasivos, secos, ríspidos e todos os sinônimos e atitudes que possam ser dadas a alguém que não deseja estabelecer qualquer tipo de contato amistoso. Praticamente foram postos para fora da casa. Saíram desolados. Sebastião era um bom moço, mas sua família inóspita.

A chegada de Khalid estimulou ainda mais Darcy e Tadeu em produzirem a perda da virgindade de Sebastião. Isso os incomodava. Homem devia sair com as mulheres e a casa de Nelcy era o ponto de encontro de todos os homens. Khalid ficou motivado a colaborar.

Mais uma vez foram à casa de Nelcy. Sebastião seguia feliz com a possibilidade de rever Priscila. Após algumas biritas, Khalid desafiou Sebastião a irem juntos com duas garotas para o mesmo quarto. Os músculos das pernas de Sebastião pareciam querer desprender-se dos ossos. Um tremor incontrolável o dominou. Sem ter tempo para responder, Raquel o puxou para si, enquanto Damascena enlaçava Khalid, sensualmente.

Conforme Khalid havia combinado os dois entrariam no quarto e somente a um sinal elas entrariam. Fechados no estreito quarto mal cheiroso, iluminado por uma vaga luz alaranjada de um abajour, Khalid despiu-se diante do olhar atônito de Sebastião. Sebastião fitava o corpo bem delineado do moço entre milhares de pensamentos que colidiam gerando uma transtornada erupção de emoções. Sebastião timidamente resistia em despir-se, até que impaciente Khalid avançou sobre ele e arrancou-lhe a bermuda. Houve um silêncio sepulcral. Khalid descobria o segredo do moço. Era uma garota.

Perdido e sem saber o que fazer, Khalid pedia perdão. Sebastião chorava. Combinaram que Sebastião estava passando mal e iriam para casa. Comprometera-se guardar isso somente para ele.

A questão é que algo havia despertado em Khalid e não demorou para que passassem a se encontrar secretamente. A mudança nos comportamentos dos rapazes foi percebida por Darcy e Tadeu que entenderam estar acontecendo algo mais íntimo entre os dois. Logo sorrisos irônicos, algumas piadas e indiretas começaram a fazerem parte do cotidiano da loja. Darcy logo decretou que Sebastião deveria ser um “mariquinha”, uma “mulherzinha” e pelo visto era “mulherzinha” do Khalid. As insinuações de Darcy fizeram com que Khalid perdesse a paciência e a tolerância e espancasse violentamente o moço. As coisas ficariam piores se não houvesse a intervenção do "Seu" Bady.

Repentinamente Sebastião desapareceu. “Seu” Bady revoltou-se dizendo que as imbecilidades de Darcy e Tadeu devem ter afastado o melhor profissional da loja. Juntamente com seu sobrinho, Khalid, resolveu ir até a casa do moço, apresentar suas formais desculpas e pedir que retornasse ao trabalho.

A casa estava silenciosa. Após muito bater palmas e chamar pelos donos da casa, uma vizinha apressou-se em atravessar a rua e dizer que eles haviam saído na madrugada da noite anterior com o caminhão de mudança.

- Como sempre não se despediram. Aliás a dona da casa falou comigo umas duas ou três vezes nesses anos todos que moraram aí...complementou a senhora. 

Os homens se entreolharam consternados. Khalid estava com o coração apertado, vivera um intenso romance e que jamais poderia revelar.

Sebastião estava distante dali para ter seu filho. A família manteria o seu segredo.

CONTOS EMANADOS DE SITUAÇÕES COTIDIANAS

“Os contos e poemas contidos neste blog são obras de ficção, qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações terá sido mera coincidência”

SABORES DO COMENDADOR

Ator Nacional: Carlos Vereza

Ator Internacional: Michael Carlisle Hall/ Jensen Ackles/ Eric Balfour

Atriz Nacional: Rosamaria Murtinho / Laura Cardoso/Zezé Mota

Atriz Internacional: Anjelica Huston

Cantor Nacional: Martinho da Vila/ Zeca Pagodinho

Cantora Nacional: Leci Brandão/ Maria Bethania/ Beth Carvalho/ Alcione/Dona Ivone Lara/Clementina de Jesus

Música: Samba de Roda

Livro: O Egípcio - Mika Waltaire

Autor: Carlos Castañeda

Filme: Besouro/Cafundó/ A Montanha dos Gorilas

Cor: Vinho e Ocre

Animal: Todos, mas especialmente gatos, jabotis e corujas.

Planta: aloé

Comida preferida: sashimi

Bebida: suco de graviola/cerveja

Mania: (várias) não passo embaixo de escada

O que aprecio nas pessoas: pontualidade, responsabilidade e organização

O que não gosto nas pessoas: pessoas indiscretas e que não cumprem seus compromissos.

Alimento que não gosta: coco, canjica, arroz doce, melão, melancia, jaca, caqui.

UM POUCO DO COMENDADOR.


Formado em Matemática e Pedagogica. Especialista em Supervisão Escolar. Especialista em Psicologia Multifocal. Mestre em Educação. Doutor Honoris Causa pela ABD e Instituto VAEBRASIL.

Comenda Rio de Janeiro pela Febacla. Comenda Rubem Braga pela Academia Marataizense de Letras (ES). Comenda Castro Alves (BA). Comendador pela ESCBRAS. Comenda Nelson Mandela pelo CONINTER e OFHM.

Cadeira 023, da Área de Letras, Membro Titular do Colegiado Acadêmico do Clube dos Escritores de Piracicaba, patronesse Juliana Dedini Ometto. Membro efetivo da Academia Virtual Brasileira de Letras. Membro da Academia Brasileira de Estudos e Pesquisas Literárias. Membro da Literarte - Associação Internacional de Escritores e Acadêmicos. Membro da União Brasileira de Escritores. Membro da Academia de Letras e Artes de Fortaleza (ALAF). Membro da Academia de Letras de Goiás Velho (ALG). Membro da Academia de Letras de Teófilo Ottoni (Minas Gerais). Membro da Academia de Letras de Cabo Frio (ARTPOP). Membro da Academia de Letras do Brasil - Seccional Suíça. Membro da Academia dos Cavaleiros de Cristóvão Colombo. Embaixador pela Académie Française des Arts Lettres et Culture. Membro da Academia de Letras e Artes Buziana. Cadeira de Grande Honra n. 15 - Patrono Pedro I pela Febacla. Membro da Academia de Ciências, Letras e Artes de Iguaba Grande (RJ). Cadeira n.º 2- ALB Araraquara.

Moção de Aplausos pela Câmara Municipal de Taquaritinga pelos serviços em prol da Educação. Moção de Aplausos pela Câmara Municipal de Bebedouro por serviços prestados à Educação Profissional no município. Homenagem pela APEOESP, pelos serviços prestados à Educação. Título de Cidadão Bebedourense. Personalidade 2010 (Top of Mind - O Jornal- Bebedouro). Personalidade Mais Influente e Educador 2011(Top of Mind - O Jornal- Bebedouro). Personalidade 2012 (ARTPOP). Medalha Lítero-Cultural Euclides da Cunha (ALB-Suíça). Embaixador da Paz pelo Instituto VAEBRASIL.

Atuou como Colunista do Diário de Taquaritinga e Jornal "Quatro Páginas" - Bebedouro/SP.
É Colunista do Portal Educação (http://www.portaleducacao.com.br

Premiações Literárias: 1º Classificado na IV Seletiva de Poesias, Contos e Crônicas de Barra Bonita – SP, agosto/2005, Clube Amigo das Letras – poema “A benção”, Menção Honrosa no XVI Concurso Nacional de Poesia “Acadêmico Mário Marinho” – Academia de Letras de Paranapuã, novembro/2005 – poema “Perfeita”, 2º colocado no Prêmio FEUC (Fundação Educacional Unificada Campograndense) de Literatura – dezembro/2005 – conto “A benção”, Menção Especial no Projeto Versos no Varal – Rio de Janeiro – abril/2006 – poema “Invernal”, 1º lugar no V Concurso de Poesias de Igaraçu do Tietê – maio/2006 – poema “Perfeita”, 3º Menção Honrosa no VIII Concurso Nacional de Poesias do Clube de Escritores de Piracicaba – setembro/2006 – poema “Perfeita”, 4º lugar no Concurso Literário de Bebedouro – dezembro/2006 –poema “Tropeiros”, Menção Honrosa no I concurso de Poesias sobre Cooperativismo – Bebedouro – outubro/2007, 1º lugar no VI Concurso de Poesias de Guaratinguetá – julho/2010 – poema “Promessa”, Prêmio Especial no XII Concurso Nacional de Poesias do Clube de Escritores de Piracicaba, outubro/2010, poema “Veludo”, Menção Honrosa no 2º Concurso Literário Internacional Planície Costeira – dezembro/2010, poema “Flor de Cera”, 1º lugar no IV Concurso de Poesias da Costa da Mata Atlântica – dezembro/2010 – poema “Flor de Cera”. Outorga do Colar de Mérito Literário Haldumont Nobre Ferraz, pelo trabalho Cultural e Literário. Prêmio Literário Cláudio de Souza - Literarte 2012 - Melhor Contista.Prêmio Luso-Brasileiro de Poesia 2012 (Literarte/Editora Mágico de Oz), Melhor Contista 2013 (Prêmio Luso Brasileiro de Contos - Literarte\Editora Mágico de Oz)

Antologias: Agreste Utopia – 2004; Vozes Escritas –Clube Amigos das Letras – 2005; Além das Letras – Clube Amigos das Letras – 2006; A Terra é Azul ! -Antologia Literária Internacional – Roberto de Castro Del`Secchi – 2008; Poetas de Todo Brasil – Volume I – Clube dos Escritores de Piracicaba – 2008; XIII Coletânea Komedi – 2009; Antologia Literária Cidade – Volume II – Abílio Pacheco&Deurilene Sousa -2009; XXI Antologia de Poetas e Escritores do Brasil – Reis de Souza- 2009; Guia de Autores Contemporâneos – Galeria Brasil – Celeiro de Escritores – 2009; Guia de Autores Contemporâneos – Galeria Brasil – Celeiro de Escritores – 2010; Prêmio Valdeck Almeida de Jesus – V Edição 2009, Giz Editorial; Antologia Poesia Contemporânea - 14 Poetas - Celeiro de Escritores, 2010; Contos de Outono - Edição 2011, Autores Contemporâneos, Câmara Brasileira de Jovens Escritores; Entrelinhas Literárias, Scortecci Editora, 2011; Antologia Literária Internacional - Del Secchi - Volume XXI; Cinco Passos Para Tornar-se um Escritor, Org. Izabelle Valladares, ARTPOP, 2011; Nordeste em Verso e Prosa, Org. Edson Marques Brandão, Palmeira dos Indios/Alagoas, 2011; Projeto Delicatta VI - Contos e Crônicas, Editora Delicatta, 2011; Portas para o Além - Coletânea de Contos de Terror -Literarte - 2012; Palavras, Versos, Textos e Contextos: elos de uma corrente que nos une! - Literarte - 2012; Galeria Brasil 2012 - Guia de Autores Contemporâneos, Celeiro de Escritores, Ed. Sucesso; Antologia de Contos e Crônicas - Fronteiras : realidade ou ficção ?, Celeiro de Escritores/Editora Sucesso, 2012; Nossa História, Nossos Autores, Scortecci Editora, 2012. Contos de Hoje, Literacidade, 2012. Antologia Brasileira Diamantes III, Berthier, 2012; Antologia Cidade 10, Literacidade, 2013. I Antologia da ALAB. Raízes: Laços entre Brasil e Angola. Antologia Asas da Liberdade. II Antologia da ACLAV, 2013, Literarte. Amor em Prosa e Versos, Celeiro de Escritores, 2013. Antologia Vingança, Literarte, 2013. Antologia Prêmio Luso Brasileiro - Melhores Contistas 2013. O tempo não apaga, Antologia de Poesia e Prosa - Escritores Contemporâneos - Celeiro de Escritores. Palavras Desavisadas de Tudo - Antologia Scortecci de Poesias, Contos e Crônicas 2013. O Conto Brasileiro Hoje - Volume XXIII, RG Editores. Antologia II - Academia Nacional de Letras do Portal do Poeta Brasileiro. antologia Escritores Brasileiros, ZMF Editora. O Conto Brasileiro Hoje - Volume XXVI - RG Editores (2014). III Antologia Poética Fazendo Arte em Búzios, Editora Somar (2014). International Antology Crossing of Languages - We are Brazilians/ antologia Internacional Cruce de Idiomas - Nosotros Somos Brasileños - Or. Jô Mendonça Alcoforado - Intercâmbio Cultural (2014). 5ª Antologia Poética da ALAF (2014). Coletânea Letras Atuais, Editora Alternativa (2014). Antologia IV da Academia Nacional de Letras do Portal do Poeta Brasileiro, Editora Iluminatta (2014). A Poesia Contemporânea no Brasil, da Academia Nacional de Letras do Portal do Poeta Brasileiro, Editora Iluminatta (2014). Enciclopédia de Artistas Contemporâneos Lusófonos - 8 séculos de Língua Portuguesa, Literarte (2014). Mr. Hyde - Homem Monstro - Org. Ademir Pascale , All Print Editora (2014)

Livros (Solos): “Análise Combinatória e Probabilidade”, Geraldo José Sant’Anna/Cláudio Delfini, Editora Érica, 1996, São Paulo, e “Encantamento”, Editora Costelas Felinas, 2010; "Anhelos de la Juvenitud", Geraldo José Sant´Anna/José Roberto Almeida, Editora Costelas Felinas, 2011; O Vôo da Cotovia, Celeiro de Escritores, 2011, Pai´é - Contos de Muito Antigamente, pela Celeiro de Escritores/Editora Sucesso, 2012, A Caminho do Umbigo, pela Ed. Costelas Felinas, 2013. Metodologia de Ensino e Monitoramento da Aprendizagem em Cursos Técnicos sob a Ótica Multifocal (Editora Scortecci). Tarrafa Pedagógica (Org.), Editora Celeiro de Escritores (2013). Jardim das Almas (romance). Floriza e a Bonequinha Dourada (Infantil) pela Literarte. Planejamento, Gestão e Legislação Escolar pela Editora Erica/Saraiva (2014).

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